quinta-feira, 19 de maio de 2016

Vaso Insigne de Devoção - Moradia Consagrada a Deus

Vas insigne devotionis, ora pro nobis.


Tira as escórias da prata, e ela fica totalmente pura. (Provérbios, 25)





Maria, obra-prima de Deus-artesão, vaso saído das suas mãos, posto em lugar de honra no meio da Igreja, Povo de Deus, é agora chamada "vaso insigne". Insigne é um adjetivo que contém duas raízes, ou, se quiserem, duas matrizes semântica: in (em), que inclui o sentido de entranhamento, de estar dentro de; e signum (que significa "sinal", "marca", "bandeira"). Portanto, um "vaso insigne" é uma obra de arte assinalável, que chama a atenção por sua riqueza e esplendor.Nem é preciso dizer que Maria é, na Igreja, um sinal especialíssimo em que Deus deixou a sua marca; que mostra o poder do amor e o carinho do Pai e reflete sua Beleza. Não admira o enturiasmo dos santos diante dela: "Prodígio celeste, espetáculo sacratíssimo" - exclama Inácio de Antioquia, ou um Pseudo-Inácio. "Verdadeira maravilha, a sempre Virgem Maria. O que há de maior do que ela, o que é que se encontrou, o que é, aliás, que se poderá encontrar um dia mais luminosa do que ela?" - pergunta extasiado São João Crisóstomo. (Serm de Nativ. B. V. M.)E o sisudo São Jerônimo não deixa por menos: "A graça foi dada aos outros parcialmente; em Maria, ao contrário, a plenitude da graça se despejou inteira". Afinal, o arcanjo a proclamou "cheia de graça" (Lc 1,28).Aqui, porém, Maria não é chamada apenas de "Vaso Insigne", mas de "Vaso Insigne de Devoção"."Devoção" - explica São Tomás de Aquino - "é um ato especial da vontade, desimpedida e preparada para fazer tudo o que se relaciona com a vontade e o serviço de Deus". Devoção é devotamento, entrega total de nós mesmos, disponibilidade tal que a gente esteja pronto a dar a vida pelo Senhor.É assim a Virgem devotíssima, sempre e toda em atitude de abandono nas mãos do Pai. "Virgem oferente, sem igual". Virgem que sabe ouvir, como escreveu Paulo VI na "Marialis Cultus", e que aprendeu, no silêncio meditativo, o mistério do ofertório de si mesma. "Devoção é o ato da vontade do homem que se oferece a Deus, para servi-lo". E porque Deus é nosso último fim, todas as coisas que fizermos em nome desse ofertório continuado de nós mesmos, recebem uma "forma nova de ser" e nos fazem "homens novos", con-formados a Cristo, o grande oferente e a grande hóstia. "Con-formados" quer dizer, aqueles que adquiriram a mesma forma de Cristo.Assim Maria. Assim nós, na medida que a reproduzirmos amorosamente na vida. (RANGEL, 1991)
Há traduções da Ladainha Lauretana para a Língua Portuguesa que apresentam esta invocação, Vas insigne devotiones, como "Moradia Consagrada a Deus". É assim, v.g., que aparece no página do Vaticano. Na tradução do livro de  Basadonna e Santarelli - grandes especialistas na Ladainha - a apresente desta maneira. Vejamos o comentário de Basadonna:
"Não sabeis que sois templos de Deus e o Espírito de Deus habita em vós"?, lembra São Paulo aos cristãos de Corinto (1Cor 3,16) e a todos os cristãos santificados pelo batismo. É a grande revelação que transformou o pensamento pagão e continua a apresentar ao homem a origem de sua dignidade altíssima. Somos templos de Deus, e o Espírito de Jesus habita em nós.Diz-se isso de todos porque o próprio Deus se fez homem e quis ter corpo como nós: para isso escolheu uma mulher como mãe que pudesse dar-lhe natureza e corpo de homem. Tal é a grandeza de Maria, sua singularidade em toda a história da humanidade: Maria deu ao Filho de Deus corpo que se formou em seu próprio corpo de mulher.Maria torna-se assim "moradia consagrada a Deus", habitação que o Filho de Deus escolher para ocupar fisicamente por nove meses antes de nascer em Belém.E moradia "consagrada", ou seja, dedicada exclusiva e plenamente a Deus por sua virgindade que não só foi consagrada por Deus pela maternidade mas também marcou por toda a vida essa mulher obediente à palavra de Deus.Precisamos aprofundar um pouco mais esse conceito que caracteriza Maria: "moradia consagrada a Deus" é para ela privilégio grandíssimo, riqueza humanamente inatingível, dom que só pode vir de Deus.O próprio Deus escolheu essa mulher para fazê-la sua moradia. Consagrou-a, ou seja, fê-la capaz de acolher em si, pequena e pobre criatura, a grandeza infinita de Deus, de inserir em seus limites de criatura a própria presença do Criador, o eterno e o infinito.A consagração torna-se assim não fechamento mas abertura sem limites, entrar na própria esfera de Deus e seu mistério, e poder fruir da plenitude total.Pode-se então entender a dignidade de todo homem que pelo fato de ser criatura é de certa forma "consagrada" a Deus. Também, mais especificamente, a dignidade de todo cristão, que no batismo recebe a própria vida de Jesus; invocar Maria com esse título lembra ao cristão sua dignidade revela-lhe o vigor que o habita. Maria, com sua pessoa e sua peculiar comunhão com Deus, revela a seus devotos o segredo da vida autêntica, conclama-os a acolher e realizar sua dignidade altíssima, e assegura-lhes que é possível atingir cada vez mais intimidade em sua relação com Deus que neles já habita. O ensinamento de São Paulo ganha assim luz ainda mais fulgente, tornando-se contínua perspectiva do cristão: ser templo de Deus, consagrar o próprio corpo à presença de Deus, cada qual segundo sua vocação, na virgindade ou no matrimônio, sempre com a delicadeza e a profundidade que jorram do dom de Deus. Maria torna-se então mãe e educadora dessa santidade comum a todos. (BELADONNA, 2000)























Notas:

BELADONNA, Giorgio. Ladainhas de Nossa Senhora. São Paulo: Loyola, 2000.
RANGEL, Paschoal. Maria, Maria.... Belo Horizonte: O Lutador, 1991.


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