sexta-feira, 20 de maio de 2016

Mãe Castíssima

Mater castissima, ora pro nobis.

Mais vale uma vida sem filhos, mas rica de virtudes: sua memória será imortal, porque será conhecida de Deus e dos homens. (Sab., 4)







Selecionamos duas passagens, de comentaristas diferentes, ao refletirem sobre esta invocação da Ladainha: Castíssima. São enfoques, que, de certa forma, complementam-se e convergem entre si, oferecendo uma bela e profunda visão deste atributo de Nossa Senhora: o primeiro do Pe Paschoal Rangel, e o segundo do Pe João Carlos Almeida. Vejamos:

A palavra “casto” parece vir de “kestós” em grego, que admitia uma variante “kastós” (desusada), do verbo “kátzein”, e significava “bordado”, “entrelaçado”, “ornamentado”. Daí veio “cesto” de vime ou de pano, todo trançado e enfeitado. O homem seria “casto”, na medida em que estivesse “ornado” de virtudes, de verdade, de pureza. Com o correr do tempo, dizem os etimologistas, parece ter havido uma contaminação semântica, isto é, houve uma aproximação com um outro adjetivo "castus”, proveniente do verbo “cáreo” (de carere), que indica falta, carência, abstinência. Aquilo que era casto por se ornado, começou a ser casto também por ser trabalhado, “castigado” pelas mãos do trabalhador que entrelaçava o vime, os fios...
Foi com este sentido que “casto” passou para a linguagem religiosa: casto é aquele que Deus trabalha, ornamenta, torna perfeito, mas exigindo dele que se “castigue”, como se castiga o estilo, para torná-lo sem excessos, enxuto, castiço. Então, o homem casto pode oferecer-se a Deus, purificado, sem vícios, sem as gorduras das paixões, abstinente. Há em latim o substantivo “castus, us”, que significa exatamente “culto”, “rito”. O casto vira hóstia, oferenda agradável ao Senhor.
É assim que Maria é Virgem castíssima, hóstia cheia de amor, sem nenhum sinal de impureza, trabalhada pelo Espírito Santo que, com seus dedos divinos, fez dela uma coisa tão bela que pode enfeitar a casa de Deus.
A castidade, na Bíblia, indica não só a pureza em relação ao sexo, mas a pureza espiritual (2Cor 11,2), a pureza em relação à verdade, afastada de toda mentira (Sl 11,17): “As palavras do Senhor são palavras castas”, isto é, imunes de qualquer falsidade, sem nenhum engano, palavras que se cumprirão.
Podemos, pois, invocar Maria: Virgem castíssima, trabalhada pela mão de Deus, cheia de beleza e verdade, rogai por nós
. (RANGEL, 1991)


Castidade é uma daquelas palavras que usamos cada vez menos. Não admira que alguns jovens nem saibam bem o que significa castidade. Todos aprendemos na catequese que o “sexto mandamento”: Não pecar contra a castidade! Ele faria parte de uma lista de proibições: não matar, não roubar, não cobiçar, não mentir… Curiosamente o novo Catecismo da Igreja Católica modificou um pouco a formulação dos Dez Mandamentos passando o “Não cometer adultério”, para o sexto mandamento e colocou o mandamento da castidade no “nono mandamento” de um modo positivo: “Guardar a castidade nos pensamentos e nos desejos”. E o que mudou? Tudo. A castidade não indica apenas algo que NÃO devo fazer, mas exatamente uma virtude que DEVO cultivar nos pensamentos e desejos. Para ser casto não basta eliminar toda a malícia, pecados sexuais, impurezas, infidelidades, etc. É preciso algo mais. A castidade é o amor vivido do jeito certo. 
Ser casto é respeitar a dignidade do corpo, da mente e do coração. A castidade habilita a pessoa à comunhão. Permite ver o sexo como um dom maravilhoso que o criador nos deixou para que pudéssemos completar a sua obra gerando e cuidado da vida. Usar este dom apenas em proveito próprio, como na masturbação, entristece o coração e provoca uma profunda frustração. A castidade é a irmã da felicidade. Um casal precisa ser casto. Esta não é uma virtude apenas para os que fazem “voto de castidade”, como os religiosos e as religiosas. Um casal casto sabe os limites e conhece as possibilidades de sua vida sexual. Isto não significa somente evitar isto ou aquilo. Castidade matrimonial significa sensibilidade masculina e feminina, reconhecer o outro no seu universo, exercitar-se na comunhão até nos pequenos gestos, celebrar a festa da vida no sorriso do neném. 
A castidade supõe uma disciplina permanente que torne possível o autodomínio. Para ser casto é preciso exercitar-se como o atleta que se prepara para uma corrida. Aquele que vive ao sabor de seus desejos e paixões é na verdade um escravo. A dependência sexual às vezes ultrapassa os limites do vício e chega à ser uma doença, uma tara, uma neurose. Educação sexual é mais do que conhecer algumas coisas sobre o aparelho reprodutor humano nas aulas de ciências da oitava série. É aprender a administrar com sabedoria e prudência esta potência de vida que Deus colocou em cada um de nós. Para viver a castidade é preciso a inteligência de não manter-se próximo do abismo. Ninguém “quase-peca”. Ou pecamos ou não pecamos. Se eu sei que em determinado ambiente vou cair é melhor evitar! Se não evito, já pequei. 
Normalmente a castidade começa pelo olhar. É um pecado social pelo qual a humanidade pagará caro, o uso da pornografia nos anúncios públicos. Não há como não ver. A insinuação provoca o pensamento e pode criar dificuldades na castidade. Porém, uma coisa é ser involuntariamente provocado. Outra coisa é procurar imagens, revistas, conversas maliciosas. Alguém poderia perguntar: Mas ainda é pecado? O mundo evoluiu!!! A Igreja ainda está nessa? Não se esqueça que o mundo gira. A moda de ontem já passou. A de hoje passará. Promiscuidade e droga estão na moda, mas nem por isso devemos canonizá-las. O crime também está na moda. Faz sucesso nas telas do cinema. Mas isto não é eterno. A libertinagem é um dogma inquestionável dos mundos modernos. Adultério, masturbação, fornicação, pornografia, prostituição, estupro, luxúria, são nomes clássicos do pecado que vem da mesma raiz da “falta de castidade”. Pecou, confesse! 
O bonito ideal da castidade é conquistado com muita luta, mas também com oração. Diante de um momento de tentação será muito útil voltar seu olhar interior para Maria e repetir: Mãe Castíssima, rogai por nós! (ALMEIDA, 2010)


















Notas:

ALMEIDA, João Carlos. Ladainha de Nossa Senhora. São Paulo: Ave Maria, 2010.
RANGEL, Paschoal. Maria, Maria.... Belo Horizonte: O Lutador, 1991.

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